OUTRO CAMINHO
Sozinho
no meio da multidão, olhava em volta, procurando referências. Um recanto
conhecido, um rosto vagamente familiar, algo que o ligasse à sua vida. Nada.
Absolutamente nada. Sorriu, feliz. Estava completamente sozinho no mundo.
Assolou-o,
novamente, aquela sensação de inebriante liberdade. Há oito horas atrás, do
outro lado do planeta, cortara todos os laços. A ideia germinava nele há algum
tempo. Era, no entanto, algo utópico que, acreditava, nunca conseguiria levar a
cabo. Começara por pensar, como quase todos nós, uma vez na vida, em como lhe
apetecia desaparecer, deixar tudo e todos para trás. Mas, ao contrário do que
acontece com a maioria das pessoas, nele a ideia foi ganhando corpo, tomando
contornos de quase obsessão. Mesmo assim, sentia-se incapaz de a concretizar.
Era apenas um refúgio num desvão escondido da sua mente. Mas, a discussão com o
chefe, aquela pequena e inconsequente troca de palavras que, noutro momento,
com outra pessoa, teria sido irrelevante, fê-lo decidir-se. Sabia que nunca
conseguiria justificar o motivo daquela tomada de decisão, naquele momento.
Documentos
e dinheiro no bolso, partiu. Sem explicações, sem despedidas. Partiu. A verdade
é que sabia que já há muito tempo tinha partido. O percurso até ao aeroporto
demorou o tamanho do seu silêncio. O táxi rodava numa cadência veloz sobre o
tapete negro da estrada. No aeroporto, o vozear da multidão toldava-lhe a
vista. Podia escolher qualquer destino e nenhum teria de ser definitivo. Podia
fazer o que lhe apetecesse. A escolha recaiu sobre o país o mais longínquo
possível da vida que deixava para trás.
E ali
estava. Sem remorsos, duvídas ou tristezas. Sabia que não ficaria na memória de
ninguém pelo poder transformador das palavras nem pelo poder regenerador dos seus atos. Seria apenas a
recordação do inexplicável. Sentia-se completamente livre. Libertara-se do pó,
do nada com que o tempo se encarregara de o cobrir.
Olhou, de
novo em redor. E deixou que os seus passos o guiassem na direção que –
livremente! – escolhera.
Olá, Ana!
ResponderEliminarEstá lindamente construído este texto, que conta uma história com que certamente muita gente se identificará:O desejo de fugir para longe, bem longe, tão longe que a realidade lá não chegue - e não impeça um novo sonho de acordar.
Abraço amigo; boa semana
Vitor