Vais morrer.
Ando a
preparar-me para esse momento há vários meses. É uma morte anunciada, mas sem
data marcada.
Preparo-me
apenas para o momento da tua morte. Faço um luto antecipado. Choro-te agora. O
sofrimento posterior vivê-lo-ei intimamente, ninguém verá a minha dor. Penso em
como serão os natais, as férias, os fins de semana sem ti. Penso, também, em
todas as horas do dia em que te recordarei, nas lembranças retomadas nos
lugares que frequentámos juntos. E nos olhares, nos gestos, nas palavras, nos
silêncios …
Mas o que
me preocupa, em primeiro lugar, é o momento da tua morte. Sinto os pensamentos
encharcados de dúvidas e incertezas. Saberei, com antecedência, quando
acontecerá? Estarei presente? Chorarei? Chorar preocupa-me. Faço-o raramente e
sei que, se começar, dificilmente conseguirei controlar-me. Não, os meus olhos
começaram já a guardar as gotas de chuva para as chorarem depois da tua morte.
E tu, chorarás? Dir-me-ás algumas palavras de despedida? Ou partirás sem
alarde, com a frieza de quem traçou, serenamente, o novo caminho? Tenho a
certeza de que pouco falaremos. Haveria tanto para dizer! Quantas palavras
choradas, quantas lembranças revividas! Ambos sabemos que pouco falaremos.
Guardaremos as palavras que deram corpo a todas as coisas que sonhámos. Nem
torrentes de lágrimas nem tempestades de suspiros.
*
Vais
morrer. No momento em que me deixares. Naquele preciso momento em que dirás as
palavras que te adivinho: “ Já não te quero como antes. Ficamos por aqui.”.
Depois,
quando a calma apaziguadora chegar e eu me convencer que nem um fantasma do teu
passado serei, atada aos fios invisíveis de que se tece a saudade, guardarei as
nossas memórias desfeitas numa caixa cheia de pedaços de pouco e conjurarei as
forças necessárias para a não abrir.
Morro
contigo.
Ana
ResponderEliminarPode-se morrer, sim, de muitas maneiras! E a pior morte de todos, afinal, até pode não ser a morte física! Entretanto, qualquer que seja a situação, o mais importante, na minha modesta opinião, é viver cada momento como se fosse o último: na verdade, quem nos garante que haverá o momento seguinte?!...
Beijinho e bom Domingo para si!
Quicas