A estopa ao pé do lume …
O
rumor das vozes que se afastavam ainda era percetível quando, a poucos metros dali,
começou a ouvir-se um crepitar ligeiro.
A estopa esticou um pouco uma ponta do
seu tecido e, espreitando por entre os ramos secos do arbusto, vislumbrou umas
fagulhas raras. Curiosa, arrastou-se para fora do arvorezita para observar a
ténue luz.
Também esta, ainda em fogo lento, se
apercebeu da discreta presença do tecido e pareceu ganhar mais vida. Alimentava-se
de uns poucos ramos ressequidos que por ali jaziam e, à vista da estopa,
espevitou-se mais. Sempre era uma novidade, um entretenimento.
Ela, atraída pela luz e pelo som do ainda
pequeno lume, aproximou-se mais um pouco. Cuidadosamente, claro. Sabia bem o previsível
triste fim que a esperava se se acercasse demasiado.
A aproximação do tecido agitou o lume
que engrandeceu, crepitando, agora, em fogo vivo, com chamas altas e fortes.
Saberia a estopa o perigo que a esperava ao brincar com o fogo? Não pretendia
fazer-lhe mal, mas o pedaço de tecido não arrepiava caminho e a tentação de o usar
como combustível era imensa. O perigo era mútuo, já que também ele, sem outra
fonte que o alimentasse, se consumiria no tecido. Por que não voltava para
trás?
Atraída pelo calor do lume, a estopa continuava
a aproximar-se. Tinha a certeza de saber onde parar para não se queimar. Era um
paninho com lume no olho: esperto, vivo, perspicaz.
Já sem controlo, o braseiro ardia,
agora, num crescendo de vaidade, atraindo para si a confiante e orgulhosa
estopa que presumia conseguir escapar quando quisesse.
A um golpe de fogo um do outro, ambos
testavam os seus limites, desafiando-se ...
Como poderia ter dito Mário-Henrique Leiria, "é o que acontece às estopas, quando se põem a brincar com o lume".
ResponderEliminarEu diria que esta ainda irá suar as estopinhas.
Olá, Ana!
ResponderEliminarSituações como estas normalmente acabam "mal"; ou "bem", consoante o ponto de vista...Só resta saber se o Diabo chegou e soprou ... como lá diz o ditado.
Bom fim de semana
Vitor