PARA LÁ DAS AMARRAS
Era uma vez uma princesa que vivia
encerrada numa torre muito alta. A sala onde se encontrava era pequena, fria e
tinha paredes muito grossas. Acorrentada por fortes correntes presas a uma
parede, para ali ficara, esquecida, encarcerada, aquando da conquista do seu
reino por inimigos vizinhos.
A princesa sabia que jamais conseguiria
sair daquele lugar, mas, rebelde como sempre havia sido, arranjara uma forma de
se evadir. Uma pequena janela permitia-lhe olhar para o mundo lá fora. O seu
horizonte terminava na orla de uma densa floresta, em frente, e nuns campos
verdes a perder de vista, à direita. Durante o dia distraía-se a ver, ao longe,
os poucos trabalhadores que lavravam as terras e um ou outro cavaleiro que se
aventurava, embora raramente, até à entrada do bosque. Mas, uma janela serve também
para voarmos, para sermos livres, para imaginarmos tudo o que quisermos. Não há
cadeados que consigam impedir os nossos sonhos de nos levarem onde quisermos. Por
isso, à noite, a princesa saía da torre envolta nos seus sonhos e partia rumo a
destinos distantes, exóticos, de outra forma inatingíveis. Vivia outras vidas,
ouvia outras vozes, sentia outros cheiros, amava muitas pessoas.
Um dia, passou por ali um garboso cavaleiro
que, fazendo jus às histórias de encantar, logo se apaixonou pela princesa.
Conhecedor da má sorte da sua amada, o cavaleiro começou a namorar a princesa,
todas as tardes, montado num dragão alado que o levava até ao cimo da torre e pairava
junto da pequena janela. A princesa ansiava, todos os dias, pela visita do
cavaleiro, mas, sabendo da impossibilidade de se libertar do cárcere, pedia-lhe
sempre que não voltasse. O cavaleiro, no entanto, não desistia. Nenhum outro
destino lhe parecia ter sentido.
Numa manhã em que cavalgava perto da
torre, pensando num desfecho feliz para esta história que ora se conta, o
cavaleiro tomou uma decisão. Chamou o dragão alado, subiu ao cimo da torre e
içou-se para o parapeito da pequena janela. Perante o espanto da princesa, o
cavaleiro entrou dentro do exíguo e frio compartimento e, não conseguindo
libertar a amada das fortes correntes que a prendiam à parede, retirou do
alforge duas grossas argolas de ferro e acorrentou-se ele à princesa.
Agora, à noite, há duas almas que saem
da janela da torre, envoltas em sonhos, partindo rumo a destinos distantes,
exóticos, de outra forma inatingíveis.
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