... pelo simples e indelével prazer da leitura e da escrita!

quinta-feira, 20 de setembro de 2012

                     NÓS

Eu não sei qual de nós é mais igual
No palco da ilusão, vestido ou nu:
Se tu, ao pores o amor num pedestal,
Ou eu, ao pô-lo dentro dum baú.

Debaixo do holofote, bem ou mal,
Há duas personagens: eu e tu;
Uma tem o papel de marginal;
A outra, o de esquecer o seu tão cru.

Ambas ouvem silêncio quando há palmas
E fingem não saber que as próprias almas
Eternizam o aplauso final: "bis".

Acabado o teatro ficam sós
E eis de novo a pergunta: "qual de nós
Na ribalta da Vida é mais feliz?"

                                                               Paulo Ilharco


Decididamente, há pessoas que nos conhecem muito bem. Há amizades assim ...

sexta-feira, 14 de setembro de 2012


A TEIA

Como habilidosa e paciente fiandeira, fiz-me seda para te tecer a vida em fios entrelaçados. Fios de silêncio costurando o tempo em teia circular, fiz-me arquiteta deste refúgio, espuma macia e aveludada, mas mais forte que aço. Vagarosamente, em alma de urdidora, no rebrilho das manhãs teci e reteci o fio, entrelacei e reentrelacei mais e mais teia, dançando ao som da brisa dos passos que te adivinhava. Esperei-te em lençol de núpcias …

E vieste. Chegaste sem avisar. Mas, agora descansada da tarefa árdua, tinha preparado o meu coração para te receber. Vi-te rodear várias teias de várias formas. As sofisticadas, as presunçosas, as falsamente ingénuas e tantas outras. Mas nem a força de todas as teias, juntas no esforço de te atrairem, te demoveu. Tranquilamente acercaste-te da minha. Subiste devagar - por vezes em palpos de aranha! -, mas sempre seguro. Fazias vibrar a teia, puxando laços, cegando nós … Dançámos ao som das cordas de um violino, finos fios de teia, numa dança nem sempre certa. Aos poucos fomos acertando o passo, até fluirmos pela teia sem atropelos nem hesitações.

Finalmente, cortei o cabo de segurança, o fio fino e seco, que, cautelosa, tecera no início. O nosso amor por um fio, amor e vida entrelaçados numa teia de aranha.

sábado, 8 de setembro de 2012


Palavras no Silêncio

Almas que voam
no silêncio de palavras
esperadas
desejadas.

Palavras-aves,
debatendo-se no silêncio,
carícias apenas adivinhadas,
beijos contidos,
sentidos,
soltos pelas bocas caladas.

Almas que voam
no silêncio de palavras …
…finalmente chegadas!

                                   7/9/12



UM SONHO POR VIVER

 
Trago este sonho por viver …
 
Consome-me por inteiro,
A antecipação do prazer de me perder!

O meu corpo desfaz-se em água quando te toco,
Numa aguda sensação de angustioso mistério,
Misto de saudade e desilusão,
De esperança falhada
Secura e dor indefinida.

Puxo o longe para o perto.
E no meu sorriso este verde …

Envolvo-te em abraços de espuma
Salpicados de sal …

Morro à porta da tua boca,
Beijo os segredos que ela encerra …

Ah, segredar-te ao ouvido
O beijo apetecido!

A tua voz chama-me dentro de mim.
Uma voz suave e densa
Como um ruído da Natureza.
E no vazio das minhas mãos estes sinais de ti …

Algo vem soerguer-me deste meu devaneio.
O silêncio cresce dentro do meu peito
E lágrimas pesadas toldam o meu olhar.
(O meu choro tem a cor do teu perfume)
Baloiço memórias, aceno saudades …

Mas, no canto do meu coração
Onde moram as coisas que amo,
Esta paz indizível!

  

   2/09/12