... pelo simples e indelével prazer da leitura e da escrita!

quinta-feira, 29 de agosto de 2013


LONGE
            O carro rolava à velocidade do passeio de domingo. Quase deserta, ao início daquela tarde de verão, a estrada secundária.
            A voz do companheiro começou a diluir-se na distância que, a pouco e pouco, se ia criando entre eles. Acenava com a cabeça, murmurava um ‘hum, hum’, de vez em quando, mas os seus olhos iam-se detendo numa curva familiar, uma casa particular, um jardim que o seu coração reconhecia, à medida que avançavam.
            Há quanto tempo não pensava nele? Na verdade pensava sempre nele. Desistira de tentar esquecê-lo. Mas há muito tempo que conseguira deixar de lembrar, constantemente, aquele tempo.
            Quando o amigo insistira em tomar aquele caminho, não pensara no assunto. Mas, à medida que os seus olhos iam reconhecendo os lugares, o coração ia recordando cada conversa, cada gargalhada, cada malícia. Já não lhe doía como antes. A angústia em forma de dor lancinante fora sendo substituída por aquela melancolia profunda.
            Impossível não comparar a alegria daqueles tempos com a monotonia do presente. O caminho fazia-se, então, de tranquilidade e sobressaltos, de risos e seriedade. Mas, sobretudo, da certeza de um caminho partilhado. Agora, apenas um vazio de saudade certa de longevidade.

1 comentário:

  1. Olá, Ana!

    Penosa esta romaria da saudade; terminada em desencanto, porque o encanto com o tempo se foi.
    Quadro de vida onde tanta gente se pode olhar, aqui muito bem pintado - usando as cores do presente e passado.

    Bom fim de semana; um abraço
    Vitor

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